Estudo Baseado em Romanos 8:26-27
Cleverson Gilvan de Oliveira Moreira
“26 Também o Espírito, semelhantemente, nos assiste em nossa fraqueza; porque não sabemos orar como convém, mas o mesmo Espírito intercede por nós sobremaneira, com gemidos inexprimíveis. 27 E aquele que sonda os corações sabe qual é a mente do Espírito, porque segundo a vontade de Deus é que ele intercede pelos santos.” Rm. 8.26-27
INTRODUÇÃO
Uma das evidências da providência divina na consecução dos seus propósitos redentivos é a Intercessão do Espírito Santo.
Nela, nos deparamos com a doce presença de Deus em nós, provendo os meios necessários para que vivamos a presente vida encorajados pela esperança do porvir.
O presente estudo tem como propósito discutir os elementos que estão envolvidos na chamada “Intercessão do Espírito”. Nosso labor passará pela definição do agente desta intercessão, seguida de uma análise da sua necessidade, da sua natureza, da sua segurança e por último, da sua relação com outras doutrinas correlatas.
Comecemos, pois, pela consideração do Agente da Intercessão.
1. O AGENTE DA INTERCESSÃO
A sessão que fala sobre a intercessão do Espírito trata de três gemidos: o da criação, o do homem regenerado e o do Espírito Santo (Rm. 8.18-27). Contudo, devemos observar que os dois primeiros se relacionam diretamente com a aflição do “suplicante”. A criação corrompida e os crentes regenerados aspiram pela plenitude da salvação.
Diante disso, alguns estudiosos acreditam que o terceiro gemido não pode ser atribuído ao Espírito, uma vez que ele não está sujeito às mesmas fragilidades anotadas nos gemidos anteriores.
Contudo, Hendriksen observa que devemos considerar a expressão em função do contexto, onde necessidades estão sendo contempladas.
Além disso, o texto indica que o agente da intercessão é o Espírito.
Perceba que a construção da idéia favorece essa interpretação. Ele diz: A criação geme, nós gememos e o mesmo Espírito, semelhantemente, nos assiste intercedendo com gemidos inexprimíveis. É o Espírito que geme. Ademais, quando Deus ouve a súplica, ele considera a “mente” ou a “intenção” do Espírito, e não do homem.
Sendo assim, o agente da intercessão é o próprio Espírito Santo.
Por outro lado devemos considerar a necessidade desta intercessão.
2. A NECESSIDADE DA INTERCESSÃO
O contexto próximo da passagem faz referência ao sofrimento provocado pela corrupção do pecado.
Assim, Paulo, apresentando as expectativas da glória porvir, diz que no presente a criação geme e suporta angústias. Naturalmente, esse estado desordenado da criação se deu em função da sua sujeição à vaidade e a escravidão do pecado. Além disso, o apóstolo observa especialmente a própria aflição do eleito que geme ansiando pela experiência plena da salvação.
Não obstante inicialmente dois gemidos serem contemplados, percebemos pela argumentação contextual que a preocupação do apóstolo é apresentar a provisão divina para aqueles que estão em Cristo Jesus (Rm. 8.22-25). Estes, embora salvos, ainda se vêem afligidos pelo pecado e, portanto, impossibilitados de buscarem, por si mesmos, a satisfação das necessidades essenciais da vida espiritual. Daí a observação do apóstolo: “não sabemos orar como convém”.
Discutindo essa matéria, John Gill afirma não ser possível tecer detalhes sobre a natureza dessa fragilidade, contudo, uma vez que experimentamos a salvação somos envolvidos num processo de santificação. Esse processo, em cada um de nós e em graus diferenciados, nos confronta com determinadas limitações. Gill observa que alguns são mais fracos na fé, outros em experiência, outros em conhecimento. Alguns são mais vulneráveis a determinados tipos de tentação e outras corrupções internas. No entanto, o Espírito Santo acompanha e vitaliza as graças que ele mesmo comunicou.
Segue-se, portanto, que a fragilidade espiritual decorrente do nosso estado de imperfeição, necessita de uma influência do Espírito Santo sustentando e aperfeiçoando o crente na sua nova vida.
3. A NATUREZA DA INTERCESSÃO
Outro aspecto importante da intercessão do Espírito diz respeito à sua natureza. Afinal de contas, o que ela é?
Mattew Henry diz que não somos juízes competentes para avaliar a nossa própria condição. Podemos dizer que a corrupção do pecado, com todos os seus efeitos, desvia o coração humano das suas reais necessidades, o que também é observado por Calvino, quando diz: “Por outro lado, visto que tão grande perfeição se acha muito acima de nossas capacidades, torna-se necessário buscar remédio que socorra a essa deficiência.”(Institutas, V. III) – Veja Tg. 4.3. Ainda na linha de raciocínio do reformador francês esse socorro é a influência diretora do Espírito Santo que “nos dita o que é reto e modera os nossos sentimentos.”.
De certo modo, o raciocínio de Calvino nos leva a entender que o Espírito age no coração do homem fazendo-o anelar pelas mais elevadas bênçãos espirituais.
Contudo, ainda precisamos entender a seguinte questão: Por que essa ação do Espírito no coração do homem é chamada de “gemidos inexprimíveis”?
A palavra grega usada aqui é “alalhtoiv”, ou seja, “inexprimíveis”, que traz a idéia de algo que é profundo demais para palavras.
Charles Erdman, refletindo sobre esse aspecto, ensina que essa ação do Espírito, ou esses “gemidos inexprimíveis” não se processam à parte do nosso entendimento, mas nele e através dele. No entanto, as aspirações e os anseios sentidos no coração do homem regenerado são demasiado profundos para serem articulados.
Nosso coração e nossa alma almejam. Eles sabem o que precisam, mas não conseguem declará-lo. Assim, afirmamos que esta intercessão do Espírito é uma ação divina no coração do homem, fazendo com que as necessidades mais íntimas sejam levadas ao Pai em oração.
4. A SEGURANÇA DA INTERCESSÃO
A partir daí, nasce outra questão: Como podemos saber que esta súplica será atendida?
Certamente podemos entender que o propósito dela é fortalecer o homem regenerado na sua experiência da nova vida. E o plano de Deus para nós é que cresçamos em santidade (Fp. 2.21; 1 Ts. 4.3 e etc.). Ademais, devemos lembrar que o ensino das Escrituras sobre a oração é que nos apliquemos na busca da vontade do Senhor.
Por tudo isso, Paulo sabia que os gemidos do Espírito estavam em perfeita harmonia com os propósitos de Deus para a vida do homem regenerado. Deste modo, ele nos diz que a eficácia desta intercessão repousa sobre duas bases:
a) Deus conhece a mente do Espírito: Essa assertiva nos remete ao conceito de conhecimento necessário de Deus. Há perfeita harmonia no relacionamento inter-trinitário. Se as aspirações não podem ser verbalizadas por nós, elas podem ser entendidas pelo Pai que “sabe qual é a mente do Espírito”.
b) Deus deseja o cumprimento da Sua vontade: O contexto posterior (Rm. 8.28) revela que há um desígnio divino. Ele está dirigindo todas as coisas e, portanto, cumprindo a sua vontade. Seguramente, portanto, podemos descansar na eficácia dessa intercessão do Espírito, porque ela busca exatamente o que Deus nos quer dar.
Portanto, a intercessão do Espírito nos remete a uma esperança certa e segura. Assim, tendo considerado isto, analisemos seu último aspecto.
5. A RELAÇÃO COM OUTRAS DOUTRINAS
A intercessão do Espírito nos conduz a duas outras doutrinas importantes. A primeira é a Obra Intercessória de Cristo e, a segunda, a Perseverança do Santos.
a) Obra Intercessória de Cristo
Quanto à Obra Intercessória de Cristo a relação se faz necessária para o estabelecimento de algumas diferenças básicas.
Estas diferenças notam-se a seguir:
A obra intercessória de Cristo é parte do seu ministério sacerdotal, realizada em função de ser Ele Mediador de superior aliança (Hb. 8.6). Ela acontece no céu e fora de nós. Já o ministério do Espírito, que decorre da obra de Cristo, é realizado na terra e dentro de nós.
b) Perseverança do Santos
Já no aspecto da Perseverança dos Santos, a relação se faz necessária para considerarmos algumas implicações importantes.
Ao despertar anelos e aspirações no coração do homem regenerado, o Espírito Santo assegura que comunicações imprescindíveis da graça de Deus alcancem o crente. Essas graças comunicadas fortalecem e consolidam a experiência da salvação. Por isso essa relação entre a Intercessão do Espírito e a Perseverança dos Santos é destacada pelo apóstolo quando ele diz: Romanos 8:31 “Que diremos, pois, à vista destas coisas? Se Deus é por nós, quem será contra nós?”.
CONCLUSÃO.
A Intercessão do Espírito é mais um elemento que corrobora com a idéia da soberania de Deus na eleição e na salvação dos seus eleitos. Tudo o que é necessário à expressão e à experiência da nova vida provém do Senhor.
Pela ação do seu Espírito somos contemplados com as mais sublimes provisões celestes. Pois por seu intermédio, Deus aplica em nós os benefícios da obra de Cristo Jesus, ainda que não possamos entendê-los na sua plenitude.